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Ter�a, 25 de Março 2008

Cumprimento da Tabela de Custas pelos Tabeliães.


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Arlei Costa Junior
3º Tabelião de Paranavaí

Aspectos sociais da fixação de emolumentos

A questão da fixação de emolumentos dos atos notariais e de registro tem sido motivo para constantes controvérsias e discussões entre os notários e registradores, bem como as autoridades judiciárias, legislativas e executivas envolvidas com sua elaboração, sem ainda excluirmos as associações que possuem interesse direto nesses atos, tal como a OAB.

As divergências de opiniões sobre esses emolumentos já nascem na elaboração da tabela de custas, onde todos os envolvidos buscam uma tabela que lhes pareça justa, social e viável. Os conflitos de interesses entre os vários envolvidos na sua elaboração, muitas vezes já a tornam indesejada e repudiada pelo grupo de indivíduos que vêem seus interesses serem atingidos pelo resultado final dos trabalhos, que culmina na tabela de emolumentos que terá vigência.

A tabela de fixação de emolumentos, tendo sido finalmente aprovada e publicada, entra em vigor. Neste momento é comum vermos a imprensa noticiando aumentos abusivos, os que tiveram seus interesses atingidos a criticarem ferrenhamente e os notários e registradores sendo acusados de praticarem preços abusivos, como se fossem eles que determinassem os emolumentos.

É evidente que todos gostariam de não ter que desembolsar nada para ter acesso aos atos notariais e registrais, bem como se fosse possível, seria muito bom que tudo o que precisássemos fosse gratuito. Seria o controle total do Estado sobre os produtos e serviços, que basicamente consiste no regime comunista de governo, que não parece ser o desejado pela população.

Os serviços notariais e registrais precisam ter os emolumentos fixados pelo poder público, pois é um serviço que foi delegado a profissionais privados que a exercem em caráter privado, ou seja, não recebem salário do poder público. Como a renda desses profissionais, que agem em nome do estado atribuindo fé pública aos documentos, não é proveniente dos cofres públicos, tornou-se necessário elaborar uma forma de remunerá-los pelos seus serviços. Esta forma foi através da cobrança dos atos por eles praticados, que são pagos diretamente pela população, quando a mesma os utiliza. Torna-se necessário, portanto a fixação dos emolumentos para que a população saiba quanto deve pagar pelos atos que lhes serão praticados. Emolumentos estes que são determinados pelos representantes da população, no exercício do poder público.

Pelos motivos vistos até aqui, percebemos que a referida tabela de emolumentos é por muitos criticada e atacada. Muitas vezes até mesmo pelos notários e registradores, que algumas vezes entendem que ela não lhes propicie suficientes rendimentos, estendendo ainda mais os conflitos de opinião sobre as peculiaridades da tabela de emolumentos.

As pessoas têm desejos e necessidades infinitos, onde levam o exercício das suas expectativas muito além da real capacidade de realizá-las no momento. Sendo, portanto razoável concluirmos que as ações que não correspondam com as expectativas das inúmeras pessoas, que por sua vez as têm de forma diversa, levem as mesmas a expressarem sua insatisfação com os fatos apresentados.

Vimos, portanto da dificuldade e diria até impossibilidade de se elaborar uma tabela de emolumentos que fosse satisfatória a todos os interessados. Diante deste fato concluímos ser de prudente raciocínio adotar-se emolumentos que gerem a máxima satisfação possível entre os interessados. Ou escrevendo de forma diferente, que minimize a insatisfação geral.

Aspectos legais da fixação de emolumentos

O fundamento legal para a elaboração da tabela de fixação de emolumentos é o § 2º, do Art. 236 da Constituição da República Federativa do Brasil (C.F.) que dispõe:

"Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro."

A Lei Federal a que se refere o artigo acima foi publicada sob nº 10.169 de 29 de dezembro de 2000 e deve ser regulada por lei estadual ou do distrito federal, para estabelecer os valores dos emolumentos, dentro dos critérios por ela estabelecidos.

Nos atendo ainda ao objetivo deste trabalho, que é o cumprimento da tabela de custas, ou emolumentos, pelos tabeliães de notas, é importante, como explanaremos posteriormente, verificar que a Lei Federal nº 8.935, de 18 de novembro de 1994, que regulamentou o Art. 236 da Constituição Federal, dispondo sobre os serviços notariais e de registro, é clara em seu Art. 8º, que dispõe:

"É livre a escolha do tabelião de Notas, qualquer que seja o domicílio das partes ou o lugar de situação dos bens objeto do ato ou negócio."

Ficando explícito que a escolha do tabelião não pode ser desvinculada da vontade das partes, competindo a elas exclusivamente a escolha do tabelião de notas, impossibilitando qualquer tipo de distribuição de serviços para os ofícios de notas. Isto é importante na medida que impossibilita a distribuição dos serviços notarias pelos Ofícios Distribuidores, pois as partes não poderiam neste caso optar pelo tabelião de sua preferência. Nesse sentido para qualquer eventual imposição da distribuição de serviços entre os tabelionatos de notas haveria necessidade de alteração do dispositivo legal supra citado.

Também é importante destacarmos, para análise futura:

* O Art. 9º, de referida Lei nº 8.935, que dispõe:

"O Tabelião de Notas não poderá praticar atos de seu ofício fora do Município para o qual recebeu delegação."

Deixando explícito a existência de uma limitação territorial para a prática dos atos notariais, que é literalmente definida como o Município para o qual o tabelião recebeu sua delegação.

* O Art. 28, ainda da Lei nº 8.935, que dispõe:

"Os Notários e Oficiais de Registro gozam de independência no exercício de suas atribuições, têm direito à percepção dos emolumentos integrais pelos atos praticados na serventia e só perderão a delegação nas hipóteses previstas em lei."

Neste artigo nos interessa a parte que trata do direito de percepção dos emolumentos integrais pelos atos praticados na serventia, que como veremos futuramente influenciará as formas possíveis da cobrança dos emolumentos.

Análise dos problemas na cobrança de emolumentos

Um dos assuntos mais comuns para se tornarem debates intermináveis em reuniões de notários é a questão do comportamento ético dos mesmos. As críticas de sempre são a cobrança de emolumentos inferior ao estabelecido e a atuação fora da área de limitação territorial. Ambos os problemas são de grande complexidade e inumeráveis aspectos legais e morais. A referência à complexidade dos temas se faz sobretudo no plano moral, na medida que por vezes a prática desses atos ditos anti-éticos são plenamente morais, e os atos ditos éticos são por muitas vezes imorais, não adentrando quanto à legalidade dos mesmos. Por vezes entendemos que a valoração do que se entende por ético é feita para se defender os interesses econômicos, financeiros e o mercado dos que detêm as maiores vantagens dentro da atual conjuntura.

Diante deste quadro, é difícil se levantar nestes encontros uma análise que seja de toda imparcial e isenta, para fins de entendimento e padronização do que seja moral e ético. Que nos valha os ensinamentos do Dr. Henrique Lenz César, ex-presidente do Tribunal de Justiça do Paraná, em sua explanação "A ótica e a ética", apresentada em alguns destes encontros, para que possamos refletir sobre as nuances relacionadas à moral e à ética.

Em virtude dos problemas ocorridos neste âmbito de comportamento ético, muitos entendem por bem a elaboração de um Código de Ética, que possa ser aplicado de maneira coercitiva e sancionatória, com a intenção de evitar a prática dos atos ditos antiéticos. Recorrendo à análise anterior, entendemos ser muito questionável a legitimidade deste Código de Ética, pois não existe um consenso sobre questões éticas e morais, bem como da dificuldade de sua elaboração de forma democrática, não prejudicando os notários hiposuficientes na defesa de seus interesses e opiniões.

A eventual realização de um código de ética coercitivo e sancionatório pode se revelar um engessamento à alguns padrões morais equivocados, gerando dificuldade na evolução moral, insatisfação e injustiça. Lembremo-nos que para cada lei penalizadora a mais temos uma liberdade a menos.

Entendemos que a entrada em vigor de uma legislação coibindo a prática de atos através de sanções pode não resolver os problemas existentes, pelo contrário, talvez venha até a agravá-los.

Restringindo nossa análise ao problema da cobrança de emolumentos inferiores ao estabelecido, poderíamos a princípio, chegar rapidamente à conclusão de que isto é uma atitude reprovável e antiética, devendo assim ser aplicada uma sanção aos que agem desta forma. Mas será que essa análise é perfeita? Muitos diriam que não, que entendem que apesar de ser um ato reprovável, esta é uma realidade da qual não se pode fugir, em virtude da concorrência pelo serviço. Citariam ainda, inúmeros casos de atividades profissionais, que embora tenham tabelas de custas fixadas pelos seus órgãos controladores, em nenhuma delas se consegue o cumprimento efetivo desta determinação, devido à luta constante pelo cliente, na qual cada um oferece o diferencial competitivo que lhe seja possível, e esse diferencial, para muitos, é o preço.

Nos parece, na situação acima proposta, que o defensor de cada um dos pontos de vista, o faz aplicando-o e imaginando-o em seu cotidiano, defendendo aquele que lhe seja mais favorável. Daí a grande dificuldade de uma discussão isenta e imparcial sobre o assunto.

Considerando a atual realidade de mercado e até mesmo a cultura capitalista de consumo existente hoje, nos parece questionável a afirmação que é imoral a cobrança inferior de emolumentos, pois quem a pratica normalmente a faz não para prejudicar o colega, mas por uma necessidade de mercado, onde o cliente procura por quem ofereça mais vantagens por menos dinheiro.

Um dos fatores que levam a essas situações é a condição do mercado onde o serviço notarial está inserido, onde existem variações enormes, e temos colegas trabalhando numa área de limitação territorial onde existem mil pessoas e outros em áreas onde existem mais de cem mil pessoas para cada serviço notarial. Esse disparate propicia que aqueles colegas infortunados sejam quase que obrigados a praticar atos fora da sua área de limitação territorial ou a preços reduzidos, para conseguirem praticar o volume de serviço necessário à sua sobrevivência, bem como a da sua família.

É certo também que essa prática de cobrança inferior de emolumentos vem muito a prejudicar o mercado de atuação dos serviços notariais, pois ela reduz o montante total arrecadado por todos os serviços notariais, ou seja, sempre que alguém cobra a menos está também prejudicando a si mesmo, pois também, por vezes, será obrigado a cobrar um preço inferior por serviços que poderia cobrar integralmente. Isso sem contabilizar o prejuízo institucional que é imensurável.

A cobrança inferior de emolumentos parece ser portanto, uma conseqüência da concorrência entre os serviços notariais, onde todos procuram oferecer melhores vantagens para os seus clientes, mesmo a custa de uma eventual redução de emolumentos. É também certo que se todos cobrassem integralmente o valor devido, as pessoas haveriam de pagar, pois os serviços notariais são de certa forma compulsórios.

A concorrência existente entre os serviços notariais tem efeitos positivos e negativos, dado as peculiaridades da função notarial, dentre eles podemos destacar:

Efeitos Positivos


A concorrência propicia um ótimo atendimento aos clientes, pois todos querem garantir que o cliente retorne ao seu estabelecimento, propiciando melhor serviço à população. Muito diferentemente da apatia e indiferença com que é tratada em algumas repartições públicas ou alguns Registros de Imóveis e outros, onde não existe concorrência.
Os serviços notariais não hesitam em realizar investimentos nas instalações, na informatização, treinamento dos funcionários, e outros que o coloquem em melhor situação de mercado.
Os tabeliães não hesitam em fazer diligências, telefonemas, e tudo o mais para simplificar a vida de seus clientes, agregando valor ao seu serviço. Ou seja, procuram estudar o ordenamento jurídico para encontrar uma solução para o problema do seu cliente, e não como alguns Registros de Imóveis que parecem vasculhar a lei para buscar alguma forma de obstruir o ingresso do título ao registro. Perdoem-me os bons registradores, mas não posso me omitir a este fato.
Efeitos Negativos


Ela torna os serviços notariais sujeitos a uma queda dos padrões éticos que deveriam ser protegidos pela profissão. Na medida que o tabelião precisa praticar o ato para ser remunerado, muitas vezes ele pode agir de forma menos criteriosa do que agiria se não tivesse que competir com seus colegas de profissão. Isto é muito prejudicial à imagem de toda a instituição notarial, pois propicia maior número de casos que envergonham a classe.
O tabelião é o defensor imparcial dos interesses das partes. Essa imparcialidade fica prejudicada na medida em que uma das partes é a que pagará pelo ato e escolhe o tabelião de sua preferência. Parte esta que pode ser privilegiada pelo tabelião, na medida que este quer garantir o serviço.
A população passa a ter uma imagem negativa dos serviços notariais, pois como o que se cobra é a atribuição da fé pública, e esta tem valores negociados fora dos atribuídos legalmente, se tem a impressão de que os serviços notariais são locais que cobram valores abusivos para 'dar uma carimbada' num papel, e onde se pode fazer todas as falcatruas desde que devidamente remuneradas.
O tabelião passa a ver no colega de profissão um concorrente que fará de tudo para lhe prejudicar, e não um aliado para elevar a já tão desgastada instituição notarial. Por vezes cria-se uma rivalidade tão grande entre os tabeliães da localidade que se torna impossível até sentarem juntos para conversarem sobre interesses comuns da instituição.
O jurista Walter Ceneviva já nos alerta em sua obra, Lei dos Notários e Registradores Comentada, sobre os problemas decorrentes dessa comercialização dos serviços, quando nos diz (pg. 53): "A cobrança de emolumentos varia de Estado a Estado, o que tem motivado a lavratura de atos em unidades da Federação inteiramente estranhas a do domicílio das partes e do bem negociado, o que não é bom, ante a evidente comercialização de um serviço que há de ser marcado pela seriedade, ainda que em regime concorrencial."; comercialização esta que também está ocorrendo dentro do âmbito estadual de forma também voraz, levando aos mesmos malefícios. Nesta mesma obra ainda nos adverte sobre o problema da criação e manutenção de cartórios sem viabilidade econômica (pg 54): "A criação de municípios sem suficiente base econômica tornou-se constante, no Brasil, a partir da segunda metade do século XX, podendo chegar a mais de seis mil até o final do milênio."; que também leva à sérios problemas neste serviço que deve ser marcado pela seriedade, onde ainda complementa (pg. 112): "A distribuição da circunscrição geográfica que desconsidere os mencionados elementos jurídicos e econômicos corresponde a uma das punições previstas no art. 32, porque reduz substancialmente a arrecadação dos serviços civis e imobiliários, sem garantir a satisfação dos encargos aos quais são submetidos. É, portanto, aplicação indireta de pena, o que encontra vedação no art. 5º da Constituição Federal."

Com relação aos emolumentos, Walter Ceneviva dispõe na obra supra citada (pg. 162): "Emolumentos correspondem, na atividade privada, ao preço do serviço. Na economia clássica, é o montante em dinheiro a ser permutado pelo serviço. Na atividade notarial e de registro, contudo, não há falar em preço, pois sua determinação não se equilibra entre as variações da oferta e da procura, segundo critérios aplicados verticalmente pelo Poder Judiciário e, assim, sem qualquer semelhança com as operações de livre mercado. Os emolumentos devem necessariamente permitir a quitação da serventia, a satisfação dos encargos tributários e deixar razoável saldo a benefício do titular, pelo exercício da delegação. Fixação que desatenta tal parâmetro será inconstitucional, pois será forma de impedir o cumprimento mesmo de sua função legal...". (grifo nosso)

Podemos perceber, conforme análises de um dos maiores juristas brasileiros sobre o assunto, que a própria lei visa à proteção da população e dos titulares destes serviços, no que se refere às peculiaridades do mercado de atuação dos referidos serviços notariais e registrais. Lei esta que procura garantir renda ao titular do serviço, seriedade na sua execução, e conseqüentemente segurança para a população.

Como vimos, a concorrência traz benefícios e malefícios à atividade notarial, mas acreditamos que com um modelo um pouco diferente do atual, e dentro de todas as regras do ordenamento jurídico, é possível se melhorar em muito tanto a imagem, como o mercado dos serviços notariais, como será adiante proposto.

Proposta de novo modelo de cobrança de emolumentos

O título deste trabalho chama-se 'Cumprimento da Tabela de Custas pelos Tabeliães. Problema ético ou jurídico?', e nos parece claro neste momento, que o problema de forma alguma pode ser apenas de ordem ética, na medida em que os motivos que levam ao não fiel cumprimento da tabela de custas são de ordem conjuntural, e não desvios de caráter dos que assim praticam. O problema é, portanto, de ordem jurídica, onde percebemos que a atual legislação possibilita e até contribui para que esse problema ocorra.

Conscientes de que a solução do problema é de ordem jurídica, é de lógica correta abandonarmos as lamentações sobre a imperfeição no comportamento dos tabeliães, não priorizarmos códigos de ética coercitivos e sancionatórios que não iriam resolver o problema, mas nos resta apenas elaborarmos novos modelos administrativos que permitam maximizar a satisfação entre todos os envolvidos na questão pertinente aos serviços notariais.

Dentro deste contexto, tomamos a iniciativa de ousar propor um sistema administrativo para a cobrança de emolumentos nos serviços notariais, que certamente não resolve todos os problemas, mas é a tentativa de dar um passo a frente para resolvermos as questões anteriormente analisadas. Com a discussão sobre a atual proposta e o surgimento de novas propostas de modelos mais amadurecidos talvez seja possível resolvermos um dos grandes problemas dos tabeliães de notas.

Novo Modelo

Basicamente a proposta ora formulada seria de uma arrecadação centralizada dos emolumentos, que seria posteriormente repassada de forma mista, uma parcela ao serviço notarial que praticasse o ato e outra parcela dividida igualmente entre todos os serviços notariais da localidade.

Esta proposta muito simples poderia resolver de forma efetiva muitos dos problemas atuais, como analisaremos.

- Primeiramente, qual o motivo de propormos uma arrecadação centralizada?

- Muito simples, para termos imparcialidade e confiabilidade na arrecadação dos valores dos emolumentos. Na medida em que a arrecadação seja realizada por terceiros não interessados, conseguiria-se um fiel cumprimento à tabela de custas, evitando-se a cobrança inferior como também a superior de emolumentos.

- Quais os atos que teriam os emolumentos arrecadados de forma centralizada?

- Apenas as escrituras, pois são os atos em que ocorrem a grande maioria dos problemas relacionados à custas, bem como são atos que levam certo tempo para serem realizados, em virtude da necessidade da coleta de diversos documentos para sua confecção.

Os demais atos, como procurações, certidões, autenticações e reconhecimento de firmas são atos que devido ao seu pequeno valor tem menor incidência de problemas relacionados à cobrança irregular de custas. Isto porque dificilmente o cliente procura vários serviços notariais para conseguir 'desconto' na realização destes atos. Além do fato que a centralização da arrecadação destes serviços seria muito prejudicial à população, na medida em que tornaria burocrática a realização de atos corriqueiros e que já funcionam de forma satisfatória.

- Quem realizaria a arrecadação centralizada das escrituras?

- Embora pudesse ser criado um órgão exclusivo para isto, sugeriríamos que fosse utilizado o já existente Ofício do Distribuidor, que além de já possuir esta função de arrecadação centralizada, já poderia fornecer à parte, o bilhete de distribuição, que já é necessário para a confecção da escritura. Bilhete este que serviria para o serviço notarial saber que os emolumentos do ato já foram recolhidos.

- Mas não é proibida a distribuição de escrituras, já que o tabelião é de livre escolha das partes?

- É verdade, a distribuição de escrituras para ofícios determinados, da forma que ocorre nas varas cíveis, é proibida, já que o tabelião é de livre escolha das partes. Mas o que o Ofício Distribuidor faria seria apenas a arrecadação centralizada dos emolumentos, fornecendo um bilhete de 'distribuição' que comprovaria o recolhimento dos emolumentos. Na posse deste bilhete, a parte se dirige ao serviço notarial de sua preferência para realizar o ato. Portanto não há prejuízo da liberdade de escolha da parte, sendo completamente legal este procedimento.

- E como seriam repassados ao serviço notarial os emolumentos arrecadados de forma centralizada?

- Bem, a divisão dos emolumentos arrecadados seria feita de forma mista, ou seja, uma parcela do emolumento arrecadado referente ao ato praticado pela serventia seria revertida diretamente em seu benefício, e a parcela restante seria dividida de forma proporcional entre os serviços notariais locais.

- E qual a vantagem desta distribuição mista dos emolumentos?

- A vantagem é que ela tenta obter os dois tipos de benefícios possíveis. Pois por um lado se fizermos uma distribuição simplesmente proporcional de todos os emolumentos arrecadados, estaríamos premiando aqueles que não realizaram o ato, tiveram menos serviço e despesas, e estariam recebendo o mesmo que aqueles que realizaram o ato, atendendo o cliente. Se fosse desta forma, acabaríamos atendendo os clientes como aqueles serviços onde não existe concorrência. Por outro lado, se o emolumento arrecadado fosse repassado diretamente em sua integralidade ao serviço notarial que realizou o ato, ele poderia simplesmente convencionar com a parte que se ela optasse por seu estabelecimento, ele restituiria uma fração dos emolumentos de volta à parte, ou seja, tudo continuaria como antes. Da forma proposta, o serviço notarial tem interesse em realizar o ato para receber a parcela que lhe cabe diretamente, mantendo o bom atendimento ao cliente (que além das escrituras também pratica outros atos), mas sem ter margem de repasse direto suficiente para que o mesmo venha a restituir à parte, pois neste caso, mesmo que a parte opte por outro serviço notarial, ele continuaria recebendo a sua parcela proporcional da distribuição.

- Mas o serviço notarial que presta o ato não sairá prejudicado?

- Não, pois diante da realidade atual, onde se praticam 'descontos' de quantia elevada sobre as escrituras, o serviço notarial que pratica o ato receberá integralmente a parcela direta sobre os atos por ele praticados, bem como a parcela proporcional que lhe cabe sobre todos os atos praticados na localidade, por todos os serviços notariais.

- Mas não estaríamos beneficiando os serviços notariais que praticam menor quantidade de atos e mesmo assim vão receber pelos atos praticados pelos outros?

- Não, pois embora estes serviços notariais venham a receber a parcela proporcional pelos atos praticados por outras serventias, se eles praticarem poucos atos receberão também pouco pelas parcelas repassadas diretamente, não lhes sendo portanto interessante esta situação. Além do que normalmente são os serviços notariais de pouco movimento que costumam praticar cobrança inferior de emolumentos, na tentativa de aumentar seus clientes e sua arrecadação, e esta forma impossibilitaria este tipo de atitude. O mais importante aqui é que todos os serviços notariais sairiam lucrando, os que praticam muitos atos e os que praticam poucos.

- E o que a população lucraria com esse sistema?

- Para a população, seria interessante no sentido de que ela estaria recolhendo os valores exatos devidos pelo ato praticado, não correndo o risco de pagar valores superiores ao disposto na tabela de custas. Além do que facilitaria o fortalecimento da instituição, que voltaria a se preocupar com os aspectos jurídicos a se melhorar no serviço, e não com rivalidade entre os colegas de profissão. Além do que acreditamos que diminuiria a quantidade de irregularidades praticadas, na medida em que os notários estariam mais garantidos que mesmo não atendendo às solicitações de um cliente que deseja algo irregular, teriam eles como garantir seus rendimentos. Além do que continuaria existindo concorrência pelo serviço, como forma de forçar um bom atendimento ao cliente, mas não da forma abusiva e desleal como ela é hoje, na qual quase todo o poder está nas mãos do cliente, pois se trata de um serviço que exige alto grau de confiabilidade.

- E de quanto seria o repasse direto e o proporcional para as serventias?

-Este é um valor que precisa ser determinado na quantia exata para que estimule a concorrência saudável, sem dar margens suficientes para que possa ocorrer restituição ao cliente. Um valor que nos parece razoável seria de 1/3 da integralidade dos emolumentos para repasse direto e 2/3 da integralidade para repasse proporcional entre todas as serventias. Mas este é um valor empírico que estimamos, o ideal seria se realizar alguns testes de campo para se determinar qual seriam as proporções ideais.

-Resumindo tudo então em um caso prático, como funcionaria esse novo modelo, com valores, etc.., se fosse posto em prática hoje, da forma descrita?

-Por exemplo, um cliente que deseja fazer uma escritura de compra e venda de um apartamento no valor de R$ 70.000,00. Então por não saber da mudança de sistemática no funcionamento dos serviços notariais, ele se dirige a um tabelionato para fazer a escritura. Lá chegando será informado de que ele precisa proceder ao pagamento das custas no Ofício Distribuidor, onde pode se dirigir e proceder ao pagamento ou solicitar ao tabelionato que assim o proceda por ele. Em ambos o Ofício Distribuidor só aceitará o pagamento integral das custas, evitando, portanto a cobrança de emolumentos inferiores ao da tabela. O cliente, neste caso dirige-se então ao Ofício Distribuidor e recolhe a quantia de R$-522,06-, referente aos emolumentos da escritura. O tabelionato que realizar o ato, de posse do 'bilhete de distribuição' receberá a parcela de repasse direto dos emolumentos, ou seja, R$-174,02- (1/3 * 522,06). Supondo-se que existam quatro tabelionatos na localidade, cada um receberá 1/4 da totalidade dos emolumentos das parcelas proporcionais, ou seja, todos receberão por esta escritura R$-87,01- (1/4 * 2/3 * 522,06). Portanto o tabelionato que lavrou a escritura receberá R$-261,03- (174,02+87,01) e cada um dos outros três receberá R$-87,01- por esta escritura, mesmo não sendo lavrada por eles. Só que quando qualquer um destes outros cartórios lavrarem escrituras, todos os outros também receberão sua quota parte, sendo que no final das contas todos acabarão recebendo mais do que hoje, pois não haveria mais a prática da cobrança de emolumentos inferiores ao da tabela de custas.

- Mas não é mais complicada essa forma de divisão dos emolumentos?

- Aparentemente sim, mas todo esse serviço seria feito pelo Ofício Distribuidor, que simplesmente repassaria para cada tabelionato o valor que lhe é devido, sem gerar complicações. Além do que, hoje já existe a necessidade do cliente proceder a 'distribuição' da escritura para fins de "livro índice", quando da sua realização, só que esse ato acaba sempre sendo feito pelo tabelionato, para facilitar a vida do cliente, portanto a serventia também pode proceder ao pagamento para o cliente.

Legalidade do Novo Modelo Proposto

Analisando-se este novo modelo proposto, dentro do nosso atual ordenamento jurídico, entendemos da sua completa legalidade, não contrariando nenhuma disposição legal, e mantendo a proteção aos bens jurídicos defendidos pela legislação. Analisemos portanto os aspectos legais referente à cobrança de emolumentos.

A Lei Federal nº 8.935, de 18 de novembro de 1994, que regulamentou o Art. 236 da Constituição Federal, dispõe em seu Art. 8º: "É livre a escolha do tabelião de Notas, qualquer que seja o domicílio das partes ou o lugar de situação dos bens objeto do ato ou negócio." Que como já mencionamos vincula a escolha do tabelião à vontade das partes, competindo a elas exclusivamente a escolha mesmo. O novo modelo proposto não altera em nada a escolha do tabelião pelas partes, só centraliza a arrecadação de emolumentos.

O Art. 28, da referida Lei nº 8.935, que dispõe: "Os Notários e Oficiais de Registro gozam de independência no exercício de suas atribuições, têm direito à percepção dos emolumentos integrais pelos atos praticados na serventia e só perderão a delegação nas hipóteses previstas em lei." Neste artigo nos interessa a parte que trata do direito de percepção dos emolumentos integrais pelos atos praticados na serventia, que poderia ser entendido como a impossibilidade de repasse misto direto e proporcional, da forma proposta. Mas nos quer parecer que isto não ocorre, o bem jurídico que a lei visa proteger é a arrecadação dos serviços notariais e de registro, impedindo que parte dos emolumentos fosse destinada a outra entidade que não os serviços notariais, como antigamente ocorria com destinação ao Fundo Penitenciário, etc... Este é um artigo que notadamente dá direitos aos notários e registradores, e estes direitos serão mais bem garantidos na forma proposta pelo Novo Modelo de Cobrança das Escrituras, pois se garante a cobrança dos emolumentos devidos na sua integralidade, como dispõe o artigo, fato que não ocorre na atual sistemática. Entendemos também que a existência de uma parcela proporcional não conflita com o disposto neste artigo, pois matematicamente, a arrecadação média distribuída não será alterada, não ocorrendo prejuízo aos notários.

O Art. 9º, ainda da Lei nº 8.935, que dispõe: "O Tabelião de Notas não poderá praticar atos de seu ofício fora do Município para o qual recebeu delegação." Deixa explícito que a limitação territorial para a prática dos atos notariais é o Município para o qual o tabelião recebeu sua delegação. Isto será significativo no momento de se determinar quais os serviços notariais da localidade estarão incluídos na divisão das parcelas proporcionais dos emolumentos das escrituras. Pelo disposto no artigo, entendemos que todos os serviços notariais do município devem estar incluídos, aí inseridos os ofícios distritais do município, que se encontram instalados fora de sede do município, mas dentro do mesmo, ou seja, dentro da sua área de atuação. É razoável porém, que pelo fato dos ofícios distritais serem Ofícios de Registro Civil que acumulam o tabelionato em caráter excepcional, para melhorar seus proventos, que lhes sejam atribuídas uma fração menor das parcelas proporcionais do que os Ofícios de Notas puros, ou seja, Tabelionato de Notas puro, já que a fonte de emolumentos dos ofícios distritais também é o Registro Civil. Como já mencionamos anteriormente, essas frações idealmente deveriam ser experimentadas para serem melhor atribuídas, mas empiricamente sugeriríamos que a fração das parcela proporcionais destinada aos Ofícios Distritais fosse de metade (1/2) do valor destinado aos serviços exclusivamente notariais, que normalmente são os que se encontram na sede do município. Desta forma atende-se aos princípios de eqüidade, bem como os do artigo acima disposto.

Entendemos, portanto, da completa legalidade deste Novo Modelo Proposto, que se integraria ao atual sistema legal, protegendo e melhorando a instituição notarial.

Considerações Finais

Respondendo novamente a pergunta título deste trabalho, entendemos que o problema da cobrança inferior de emolumentos, não cumprindo a tabela de custas, que vem sendo praticada pelos tabeliães, não é apenas um problema ético e sim um problema jurídico. Discordamos completamente daqueles que sugerem que os tabeliães de notas não merecem a tabela de emolumentos que possuem, pois não a aplicam da forma devida. Isto porque este tipo de atitude reprovável é conseqüência da luta diária por melhores rendimentos e maiores mercados, que constitui um comportamento típico da sociedade de consumo que vivemos hoje.

A criação de um Código de Ética coercitivo e sancionatório nos parece ser de um risco por demais elevado, considerando os seus eventuais benefícios. Bem como ser de questionável legitimidade na medida que inexiste um consenso sobre questões éticas e morais, e ainda da dificuldade de sua elaboração de forma democrática, não prejudicando os hiposuficientes na defesa de seus interesses e opiniões. Lembrando ainda, que ele pode se revelar um engessamento à alguns padrões morais equivocados, gerando dificuldade na evolução moral, insatisfação e injustiça.

O novo modelo proposto neste trabalho, visa aprimorar o modelo de cobrança de emolumentos atualmente existente nos serviços notariais, que é motivo de tantas discussões e discórdia entre os colegas notários. E entendemos que, se imperfeito, ele certamente é um passo adiante na eterna busca de um sistema ideal; se ousado, busca quebrar alguns dos nossos paradigmas, mas principalmente tem por objetivo melhorar a atual sistemática. Possibilitaria ainda a união da classe rumo a uma integração indispensável para o futuro, que exigirá muitas melhorias da já tão desgastada imagem dos serviços notariais e registrais. Integração esta que certamente exigirá um sistema centralizado e de distribuição de emolumentos, já que o futuro deverá nos levar à serviços on-line de emissão de certidões, que poderão ser de outras serventias, reconhecimento de firmas onde as fichas se encontrem em outro tabelionato e outros que surgirão. Acreditamos que neste momento em que as nossas instituições estão sendo alvos de ataques da imprensa e de mudanças drásticas na legislação, devemos nos unir e refletir sobre nossas atitudes. Talvez se não abandonarmos nosso conservadorismo e abraçarmos novas soluções, podemos ficar tão distantes da realidade que se torne injustificada a razão da existência da nossa instituição.

Somos otimistas quanto ao futuro, pois ele pode nos ser tão brilhante quanto nós o quisermos que ele seja. Este é o momento de quebrarmos nossos paradigmas e renascermos para a nova sociedade que surge nesta virada de milênio. Renascermos com novos serviços, com novas formas de oferecer segurança, minimizando os litígios de nossos clientes, que sempre foi e continuará sendo a razão da nossa existência.

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