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Segunda, 13 de Dezembro 2010

COMO DEVE PROCEDER O REGISTRADOR

 

 

 

Foi aprovada a lei 12.344/10 que alterou o artigo 1.641 do Código Civil nos seguintes termos:

“Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento: (...) II - da pessoa maior de 70 (setenta) anos”.

Diante deste novo texto, os registradores civis das pessoas naturais devem tomar a seguintes providências:

1 verificar todas as habilitações relativas a pessoas entre 60 e 70 anos de idade, cujo casamento ainda não tenha sido realizado;

2 entrar em contato com as partes; antes da celebração do casamento;

3 esclarecer-lhes a respeito da alteração legislativa;

4 tomar declaração por termo, de que os nubentes estão cientes de que na ausência de escolha o regime será o da comunhão parcial; e

5 possibilitar-lhes a escolha de regime de bens na forma legal, respeitada a necessidade de pacto antenupcial para qualquer regime que não seja o da comunhão parcial de bens.

Fundamentação:

SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS SOMENTE AOS 70 ANOS

LEI 12.344/2010

Em 10 de dezembro de 2010, foi publicada e entrou em vigor a Lei 12.344 de 09 de dezembro de 2010, que alterou o artigo 1.641 do Código Civil, o qual passou a ter a seguinte redação:

“Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento: (...) II-da pessoa maior de 70 (setenta) anos”(não destacado no original).

Essa substancial alteração representa que, a partir da mencionada lei, as pessoas com mais de 60 (sessenta) e menos de 70 (setenta) anos, que antes eram obrigadas a casar no regime da separação de bens, passam a ter liberdade na escolha do regime.

Alguns[1] defendem que o aumento de dez anos na regra não soluciona a inconstitucionalidade e ainda representa muito pouco. Segundo eles, o ideal seria a liberdade plena de escolha do regime de bens por pessoa capaz, em qualquer idade.

De qualquer forma, o que não se pode deixar de reconhecer é que essa mudança representa um passo significativo do ponto de vista da coerência do sistema jurídico.

Ora, se hoje a aposentadoria compulsória dos servidores públicos civis – e nestes se incluem os juízes de direito - se dá aos setenta anos de idade, isso se deve ao fato de que o legislador já reconhece há mais de vinte anos a capacidade mental dessas pessoas de decidir atos extremamente delicados relacionados à vida de terceiros[2]. Porque tanta demora, então, para se permitir que o idoso com idade entre sessenta e setenta anos decida sobre a sua própria vida e sobre o patrimônio que lhe pertence? E é por isso que se reitera que se a nova lei não é perfeita, pelo menos tem o mérito de tornar o ordenamento mais coerente.

Todavia, a aplicação do novo diploma não é tão simples quanto possa parecer.

Inicialmente ressalta-se que cabe ao registrador civil informar esta alteração às partes interessadas no casamento, por força do artigo 1.528 do Código Civil.

Avançando, vislumbra-se importante questão que emerge e demanda solução, qual seja a das habilitações iniciadas ou realizadas anteriormente à lei, cujos casamentos apenas serão realizados após a sua vigência. Pergunta-se: em tais casos, deve-se aplicar a regra da nova lei ou celebra-se o casamento no regime da separação obrigatória de bens?

A primeira resposta que vem à mente dos registradores é a de se utilizar por analogia a solução dada a uma questão similar ocorrida quando do advento da Lei 6.515/77.

Naquela ocasião, pacificou-se o entendimento de que as pessoas que se habilitaram antes da vigência da lei, optando pelo regime da comunhão universal de bens, tinham o direito adquirido de ver realizado o seu casamento conforme o regime antes escolhido, independentemente de qualquer formalidade introduzida pela nova lei (i.e. exigência de pacto antenupcial).

Prevaleceu, assim, a lei vigente no momento da manifestação de vontade e efetivação da escolha de regime de bens no processo de habilitação. Neste sentido podem ser citados:

1. Acórdão do Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo na Apelação Cível Nº 22.860-0/5, Comarca de Catanduva, datado de 23 de junho de 1995, com a seguinte ementa:

Procedimento de dúvida - Escritura de compra e venda - Registro – Inexistência de pacto antenupcial formalizado - Adquirente do imóvel cassado sob o regime da comunhão universal de bens, já no advento da Lei 6.515/77 - Ausência decorrente de equívoco do Oficial do Cartório do Registro Civil, devendo prevalecer a intenção inequívoca do casal em adotar referido regime de bens – Suprimento da falta do pacto, ademais, determinado judicialmente, com a devida averbação no assento de casamento – Configuração de recusa injustificável – Recurso provido.

 

2. Acórdão do Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo na Apelação Cível Nº 173-6/0, Comarca de Ourinhos, de 29 de junho de 2004, de cuja decisão se extrai que:

“os noivos escolheram na habilitação de casamento o regime legal que então vigorava, declarando expressamente que pretendiam se casar pela comunhão de bens. Em razão disso, foi dispensada a elaboração de pacto antenupcial. Assim, deve prevalecer a vontade inequívoca dos nubentes de adotar o regime da comunhão de bens”.

Todavia, não parece ser esta a solução adequada para o caso ora enfrentado. Tratam-se de situações essencialmente diferentes.

No caso da Lei 6.515/77, houve efetivamente uma escolha de regime de bens manifestada pelas partes com base na lei então vigente. Isso permitiu que as decisões privilegiassem a autonomia privada e fizessem valer a vontade inequivocamente manifestada.

Situação totalmente diferente é o caso da atual lei 12.344/10. Aqui, está-se diante de lei nova, que veio basicamente abolir uma sanção legal existente. Se preferirem os mais técnicos: a nova lei acabou com uma verdadeira limitação da autonomia privada, beneficiando uma parcela considerável da população.

Mas atenção! As pessoas entre 60 e 70 anos de idade foram recentemente privadas de sua autonomia durante o processo de habilitação para o casamento. Não lhes foi dada a oportunidade de escolha do regime de bens, motivo pelo qual a alteração legislativa deve ser aplicada de pronto aos casamentos ainda não celebrados[3].

Veja-se que estas pessoas não optaram pelo regime da separação de bens, não havendo como este prevalecer no casamento.

Tampouco se poderia argumentar que incidiria a regra vigente no momento da habilitação quando a escolha deveria ser feita, vez que a regra do artigo 1.641 do Código Civil é norma limitativa de autonomia privada e deve ser interpretada de maneira restritiva, ou seja, imposta somente àqueles casos que, inequivocamente, no momento do casamento, enquadram-se nas hipóteses vigentes.

Assim, as pessoas entre 60 e 70 anos de idade, já habilitadas ou que já iniciaram o processo de habilitação para o casamento, não estão mais inseridas na limitação legal do mencionado artigo 1.641. Deve a elas ser aplicada a regra geral de regime de bens, que é a livre escolha nos termos do artigo 1.639 do Código Civil.

Surge, porém, um impasse: A estas pessoas não foi dada a oportunidade de escolha do regime de bens durante a habilitação, o que levará à incidência do artigo 1.640 do Código Civil, que prevê que na falta de escolha vigora o regime da comunhão parcial de bens.

Em outras palavras, entre os nubentes, aos quais não foi dada a oportunidade de escolha e aos quais foi informado que o regime de bens seria o da separação obrigatória, será aplicado o regime da comunhão parcial de bens. Impossível aceitar-se tal situação.

A solução para o impasse reside na atuação dos registradores civis das pessoas naturais, vez que é seu dever:

a- esclarecer os nubentes quanto aos regimes de bens, por força do artigo 1.528 do Código Civil;

b- zelar pela eficácia dos atos e negócios jurídicos, por força do artigo 1º da lei 8935/94 e do artgio 1º da Lei 6015/73;

c- garantir a regular aplicação da lei e da constituição, bem como o regular exercício dos direitos e da autonomia privada pela partes, por força dos princípios da legalidade e da juridicidade afetos à função de registrador.

Diante disso, os registradores civis das pessoas naturais devem tomar as seguintes providencias:

1 verificar todas as habilitações que estejam na situação em comento (pessoas entre 60 e 70 anos de idade);

2 entrar em contato com as partes, antes da celebração do casamento;

3 esclarecer-lhes a respeito da alteração legislativa;

4 tomar declaração por termo, de que os nubentes estão cientes de que na ausência de escolha o regime será o da comunhão parcial de bens; e

5 possibilitar-lhes a escolha de regime de bens na forma legal, respeitada a necessidade de pacto antenupcial para qualquer regime que não seja o da comunhão parcial de bens[4].

Somente assim os registradores de pessoas naturais estarão cumprindo a lei, a Constituição e agindo com responsabilidade social.

 


[1] Inclusive um dos autores do presente estudo ao comentar o Projeto de Lei que deu origem à alteração em comento. Camargo Neto, Mario de Carvalho. Liberdade para escolher o regime de bens na melhor idade. In. Informativo da ARPEN-SP, nº 103.

[2] Art. 186, II, da Lei 8.112/90.

[3] Pode-se ir mais longe e discutir até a possibilidade de a lei retroagir seu efeitos para alcançar os casamentos já celebrados, os quais poderiam ser revistos pelo Poder Judiciário em sede de “Ação de alteração de regime de bens”.

[4] “A alteração de regime de bens feita no memorial de habilitação para o casamento poderá ser alterada até a celebração de casamento.”(Santos,Reinaldo Velloso. Registro Civil das Pessoas Naturais. Porto Alegre: safE, 2006.p. 100).

 

Mario de Carvalho Camargo Neto[1]

Fabio Leghetti[2]

Lucas Furlan Sabbag[3]

 


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