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Sexta, 28 de Dezembro 2018

Lei de Multipropriedade

Condomínio em Multipropriedade – analise da Lei 13.777/2018.

 

 

 

 

Por Filipe Gustavo Barbosa Maux – Professor da UNP, IAP – Cursos, Notário e Registrador.

 

 

1 - Introdução:

 

A lição comezinha de introdução ao direito nos ensina que o direito é o conjunto de normas e regras que regula a vida em sociedade. Se a sociedade transforma ou modifica as normas vigentes o direito precisa acompanhar, para normatizar e regular. Assim foi com a edição da Lei 13.777/2018, que regulamentou e normatizou para o registro do imóveis a multipropriedade, com a inclusão do Capitulo VII-A do Código Civil, criando o “Condomínio em Multipropriedade”. 

Como ensina a doutrina mais abalizada, a “multipropriedade” de imóveis originou-se na década de 1960, na França, para reanimar a economia pós Segunda Guerra Mundial e se espalhou pelo mundo. 

Com efeito, com a instituição da propriedade múltipla várias pessoas são coproprietárias de um mesmo imóvel, cada uma possuindo uma fração da propriedade deste e podendo usufruir, individualmente, por um determinado período de tempo proporcional à fração adquirida.

Nos Estados Unidos e Europa a insitutição e normatização da multipropriedade é uma realidade. No Brasil não existe regulamentação própria. Com a edição da Lei 13.777/2018, a Multipropriedade foi alçada a categoria de direito com uma relação jurídica que traduz o aproveitamento econômico de uma propriedade, em unidades fixas e sucessivas de tempo, para uso exclusivo de seus coproprietários, em esquema de revezamento. 

Importante assevera que a multipropriedade não se confunde com o timesharing (que é um contrato de serviço por meio do qual são obtidos os direitos de uso de unidades imobiliárias, normalmente detidas por redes hoteleiras. No timesharing a utilização das unidades imobiliárias também é pautada pelo fracionamento do tempo, contudo, enquanto o Timesharing envolve um direito de obrigação pessoal, a Multipropriedade combina negócios de direitos reais com direitos obrigacionais - obrigação pessoal. Esse sistema é regulado pelo Decreto Lei n. 7.381/2010, que regulamenta a Lei 11.771/2008 – Lei do Turismo)

A multipropiedade também não guarda correlação com o contrato “buil to suit”, que é um contrato atípico, previsto na Lei 12.744/2012, que envolve contrato de locação com empreitada, visto que a multipropriedade envolve direito real.

A Lei 13.777/2018, deu nova redação ao Código Civil, introduzindo o Art. 1.358-C, que definiu a multipropriedade como o regime de condomínio em que cada um dos proprietários de um mesmo imóvel é titular de uma fração de tempo, à qual corresponde a faculdade de uso e gozo, com exclusividade, da totalidade do imóvel, a ser exercida pelos proprietários de forma alternada.

Destarte, a multipropriedade não se extinguirá automaticamente se todas as frações de tempo forem do mesmo multiproprietário.

O imóvel objeto da multipropriedade, possui as seguintes características: é indivisível, não se sujeitando a ação de divisão ou de extinção de condomínio; inclui as instalações, os equipamentos e o mobiliário destinados a seu uso e gozo.

Com relação ao tempo de cada fração, o mesmo é indivisível, sendo, o período correspondente a cada fração de tempo será de, no mínimo, 7 (sete) dias, seguidos ou intercalados, e poderá ser:

I - fixo e determinado, no mesmo período de cada ano;

II - flutuante, caso em que a determinação do período será realizada de forma periódica, mediante procedimento objetivo que respeite, em relação a todos os multiproprietários, o princípio da isonomia, devendo ser previamente divulgado; ou

III - misto, combinando os sistemas fixo e flutuante.

Destarte, todos os multiproprietários terão direito a uma mesma quantidade mínima de dias seguidos durante o ano, podendo haver a aquisição de frações maiores que a mínima, com o correspondente direito ao uso por períodos também maiores.

2 - Da Instituição da Multipropriedade:

 

Institui-se a multipropriedade por ato entre vivos ou testamento, registrado no competente cartório de registro de imóveis, devendo constar daquele ato a duração dos períodos correspondentes a cada fração de tempo.

Além das cláusulas que os multiproprietários decidirem estipular, a convenção de condomínio em multipropriedade determinará:

I - os poderes e deveres dos multiproprietários, especialmente em matéria de instalações, equipamentos e mobiliário do imóvel, de manutenção ordinária e extraordinária, de conservação e limpeza e de pagamento da contribuição condominial;

II - o número máximo de pessoas que podem ocupar simultaneamente o imóvel no período correspondente a cada fração de tempo;

III - as regras de acesso do administrador condominial ao imóvel para cumprimento do dever de manutenção, conservação e limpeza;

IV - a criação de fundo de reserva para reposição e manutenção dos equipamentos, instalações e mobiliário;

V - o regime aplicável em caso de perda ou destruição parcial ou total do imóvel, inclusive para efeitos de participação no risco ou no valor do seguro, da indenização ou da parte restante;

VI - as multas aplicáveis ao multiproprietário nas hipóteses de descumprimento de deveres.

3 -  Dos Direitos e das Obrigações do Multiproprietário:

São direitos do multiproprietário, além daqueles previstos no instrumento de instituição e na convenção de condomínio em multipropriedade:

I - usar e gozar, durante o período correspondente à sua fração de tempo, do imóvel e de suas instalações, equipamentos e mobiliário;

II - ceder a fração de tempo em locação ou comodato;

III - alienar a fração de tempo, por ato entre vivos ou por causa de morte, a título oneroso ou gratuito, ou onerá-la, devendo a alienação e a qualificação do sucessor, ou a oneração, ser informadas ao administrador;

IV - participar e votar, pessoalmente ou por intermédio de representante ou procurador, desde que esteja quite com as obrigações condominiais, em:

a) assembleia geral do condomínio em multipropriedade, e o voto do multiproprietário corresponderá à quota de sua fração de tempo no imóvel;

b) assembleia geral do condomínio edilício, quando for o caso, e o voto do multiproprietário corresponderá à quota de sua fração de tempo em relação à quota de poder político atribuído à unidade autônoma na respectiva convenção de condomínio edilício.

São obrigações do multiproprietário, além daquelas previstas no instrumento de instituição e na convenção de condomínio em multipropriedade:

I - pagar a contribuição condominial do condomínio em multipropriedade e, quando for o caso, do condomínio edilício, ainda que renuncie ao uso e gozo, total ou parcial, do imóvel, das áreas comuns ou das respectivas instalações, equipamentos e mobiliário;

II - responder por danos causados ao imóvel, às instalações, aos equipamentos e ao mobiliário por si, por qualquer de seus acompanhantes, convidados ou prepostos ou por pessoas por ele autorizadas;

III - comunicar imediatamente ao administrador os defeitos, avarias e vícios no imóvel dos quais tiver ciência durante a utilização;

IV - não modificar, alterar ou substituir o mobiliário, os equipamentos e as instalações do imóvel;

V - manter o imóvel em estado de conservação e limpeza condizente com os fins a que se destina e com a natureza da respectiva construção;

VI - usar o imóvel, bem como suas instalações, equipamentos e mobiliário, conforme seu destino e natureza;

VII - usar o imóvel exclusivamente durante o período correspondente à sua fração de tempo;

VIII - desocupar o imóvel, impreterivelmente, até o dia e hora fixados no instrumento de instituição ou na convenção de condomínio em multipropriedade, sob pena de multa diária, conforme convencionado no instrumento pertinente;

IX - permitir a realização de obras ou reparos urgentes.

4 - Da Transferência da Multipropriedade:

A transferência do direito de multipropriedade e a sua produção de efeitos perante terceiros dar-se-ão na forma da lei civil e não dependerão da anuência ou cientificação dos demais multiproprietários.

Não haverá direito de preferência na alienação de fração de tempo, salvo se estabelecido no instrumento de instituição ou na convenção do condomínio em multipropriedade em favor dos demais multiproprietários ou do instituidor do condomínio em multipropriedade.

O adquirente será solidariamente responsável com o alienante pelas obrigações decorrentes da multipropriedade, caso não obtenha a declaração de inexistência de débitos referente à fração de tempo no momento de sua aquisição.

5 - Da Administração da Multipropriedade:

A administração do imóvel e de suas instalações, equipamentos e mobiliário será de responsabilidade da pessoa indicada no instrumento de instituição ou na convenção de condomínio em multipropriedade, ou, na falta de indicação, de pessoa escolhida em assembleia geral dos condôminos.

O administrador exercerá, além daquelas previstas no instrumento de instituição e na convenção de condomínio em multipropriedade, as seguintes atribuições:

I - coordenação da utilização do imóvel pelos multiproprietários durante o período correspondente a suas respectivas frações de tempo;

II - determinação, no caso dos sistemas flutuante ou misto, dos períodos concretos de uso e gozo exclusivos de cada multiproprietário em cada ano;

III - manutenção, conservação e limpeza do imóvel;

IV - troca ou substituição de instalações, equipamentos ou mobiliário, inclusive:

a) determinar a necessidade da troca ou substituição;

b) providenciar os orçamentos necessários para a troca ou substituição;

c) submeter os orçamentos à aprovação pela maioria simples dos condôminos em assembleia;

V - elaboração do orçamento anual, com previsão das receitas e despesas;

VI - cobrança das quotas de custeio de responsabilidade dos multiproprietários;

VII - pagamento, por conta do condomínio edilício ou voluntário, com os fundos comuns arrecadados, de todas as despesas comuns.

6 - Disposições Específicas Relativas às Unidades Autônomas de condomínios Edilícios:

O condomínio edilício poderá adotar o regime de multipropriedade em parte ou na totalidade de suas unidades autônomas, mediante:

I - previsão no instrumento de instituição; ou

II - deliberação da maioria absoluta dos condôminos.

No caso previsto no inciso I, a iniciativa e a responsabilidade para a instituição do regime da multipropriedade serão atribuídas às mesmas pessoas e observarão os mesmos requisitos indicados nas alíneas a, b e c e no § 1º do art. 31 da Lei nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964.

O condomínio edilício em que tenha sido instituído o regime de multipropriedade em parte ou na totalidade de suas unidades autônomas terá necessariamente um administrador profissional.

Na hipótese de inadimplemento, por parte do multiproprietário, da obrigação de custeio das despesas ordinárias ou extraordinárias, é cabível, na forma da lei processual civil, a adjudicação ao condomínio edilício da fração de tempo correspondente.

Na hipótese de o imóvel objeto da multipropriedade ser parte integrante de empreendimento em que haja sistema de locação das frações de tempo no qual os titulares possam ou sejam obrigados a locar suas frações de tempo exclusivamente por meio de uma administração única, repartindo entre si as receitas das locações independentemente da efetiva ocupação de cada unidade autônoma, poderá a convenção do condomínio edilício regrar que em caso de inadimplência:

I - o inadimplente fique proibido de utilizar o imóvel até a integral quitação da dívida;

II - a fração de tempo do inadimplente passe a integrar o pool da administradora;

III - a administradora do sistema de locação fique automaticamente munida de poderes e obrigada a, por conta e ordem do inadimplente, utilizar a integralidade dos valores líquidos a que o inadimplente tiver direito para amortizar suas dívidas condominiais, seja do condomínio edilício, seja do condomínio em multipropriedade, até sua integral quitação, devendo eventual saldo ser imediatamente repassado ao multiproprietário.

O multiproprietário somente poderá renunciar de forma translativa a seu direito de multipropriedade em favor do condomínio edilício.

Para a renuncia é necessário que o multiproprietário esteja em dia com as contribuições condominiais, com os tributos imobiliários e, se houver, com o foro ou a taxa de ocupação.

7 – Alterações na Lei de Registros Públicos: 

Com a criação da multipropriedade, houve necessidade de alteração na Lei  de Registros Públicos – Lei 6.015/73.

 

O inciso II do artigo 176 da LRP, que trata dos requisitos da matricula dos imóveis, passou a dispor, com relação a multipropriedade, que tratando-se de imóvel em regime de multipropriedade, a indicação da existência de matrículas, passou a ter os seguintes requisitos:

Quando o imóvel se destinar ao regime da multipropriedade, além da matrícula do imóvel, haverá uma matrícula para cada fração de tempo, na qual se registrarão e averbarão os atos referentes à respectiva fração de tempo.

Cada fração de tempo poderá, em função de legislação tributária municipal, ser objeto de inscrição imobiliária individualizada, sendo incidente IPTU, proporcional, pela fração do tempo. Assunto que deve ser tratado e regularizado pela legislação municipal.

Por fim, foi determinado o registro no Livro 3 – “auxiliar”, as convenções de condomínio edilício, condomínio geral voluntário e condomínio em multipropriedade.

8 – Conclusão:

Com a novidade legislativa da multipropriedade, foi selado o entendimento do STJ (STJ. 3ª Turma. REsp 1.546.165-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. para acórdão Min. João Otávio de Noronha, julgado em 26/4/2016 (Info 589).), de que a  multipropriedade  imobiliária, possui natureza jurídica de direito   real, harmonizando-se com os institutos constantes do rol previsto no art. 1.225 do Código Civil, sendo diferenciada do regime de “time-sharing” e do contrato “buil to suit”, que são contratos, com natureza de direito obrigacional.

 

Nesse sentido, atualmente ampliamos o rol de espécie de condomínios existentes na legislação brasileira: a) Condomínio tradicional (que pode ser voluntário ou necessário);

b) Condomínio edilício; c) Condomínio em lotes; d) Condomínio urbano simples;  e) Condomínio em multipropriedade.

 

Novidade legislativa que deve ser estudada e muito importante para o futuro do registro de imóveis.

 

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