Essa não é uma questão consolidada. Uma parte da doutrina acredita que devem ser considerados pela justiça brasileira tão somente para alcançar a igualdade dos herdeiros no papel, mas a divisão, na prática, deverá ser feita junto ao país responsável.
Não são raras as vezes em que a sucessão hereditária engloba bens situados no exterior. Com o passar dos anos, tornou-se comum o interesse das pessoas em adquirir, por exemplo, imóveis no exterior, participações em empresas no exterior e realizar investimentos internacionais.
Ocorre que, com o falecimento destes titulares surge a necessidade de abertura de inventário para a partilha de seus bens. Com relação aos bens situados no Brasil, não há dúvidas de que serão partilhados por inventário realizado no próprio país.
Todavia, a dúvida é: e com relação aos bens situados no exterior?
Essa não é uma questão consolidada. Uma parte da doutrina acredita que devem ser considerados pela justiça brasileira tão somente para alcançar a igualdade dos herdeiros no papel, mas a divisão, na prática, deverá ser feita junto ao país responsável. Em outras palavras, apesar de parte do acervo estar no exterior, estes seriam computados nas partilhas, equilibrando-se os quinhões levando em consideração o patrimônio integral do de cujus, mas a partilha em si deve ser feita no país de origem do bem.
No entanto, a posição majoritária é de que referidos bens (móveis ou imóveis) sequer serão considerados na partilha e deverão ser inventariados no local em que se encontram, à luz do princípio da pluralidade de juízos sucessórios.
Apesar de a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro incluir o Brasil no sistema de unidade da sucessão, o qual determina que todo o patrimônio do de cujus deverá ser partilhado de acordo com a mesma legislação, este se aplica tão somente aos bens situados no país, visto que, em razão das regras de jurisdição internacional, é impossível que o princípio unitário seja exercido plenamente, já que é necessário respeitar a lei do países em que cada bem se localiza.
Assim, no caso de falecimento, os herdeiros devem providenciar a abertura de inventário no Brasil para a partilha dos bens localizados no país, e, caso haja herança no exterior, deve ser aberto inventário no respectivo local de situação de cada bem.
Nesse sentido, há inúmeras decisões do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, bem como julgado recente do Superior Tribunal de Justiça reconhecendo que “(.) tendo em vista que a sucessão de bens do de cujus situados no estrangeiro regula-se pela lei do país alienígena, nos termos do art. 23, inciso II, do CPC/15 (art. 89, II, do CPC/73), o qual preconiza o princípio da territorialidade, mostra-se descabida a solicitação de informações a instituição financeira situada no estrangeiro (Suíça no presente caso), uma vez que os valores lá constantes da titularidade do autor da herança, à data da abertura da sucessão, não serão submetidos ao inventário em curso no Brasil.” (AgInt no AREsp 1.297.819/SP 2018/0121427-7, min. rel. Marco Aurélio Bellizze, j. em 15/10/18).
Por outro lado, é importante observar que, em caso de separação judicial, o mesmo entendimento não foi aplicado pelo Superior Tribunal de Justiça. Em 2017, a Il. ministra Maria Isabel Gallotti proferiu decisão determinando ser possível que o Poder Judiciário Brasileiro reconheça direito decorrente de dissolução de sociedade conjugal relativo a bem do casal localizado no exterior, mesmo que sua eficácia esteja limitada (REsp 1.552.913/RJ 2008/0194533-2, j. em 2/2/17).
Naquele caso específico, o STJ considerou irrelevante o local em que o bem estava depositado (dinheiro/conta bancária no exterior), uma vez que o que seria reconhecido em favor dos herdeiros é o direito do crédito a ser executado dentro das possibilidades do patrimônio do devedor no Brasil ou no exterior.
Diante desse cenário, questiona-se se este entendimento adotado pelo STJ em caso de separação judicial não deveria ser estendido para as hipóteses de herança, uma vez que simplificaria, e muito, o procedimento da partilha se o direito aos bens localizados no exterior pudesse ser efetivamente considerado em inventário realizado no Brasil.
De todo modo, tendo em vista a crescente globalização e o aumento no número de aquisições no estrangeiro, os proprietários de bens no exterior devem sempre se atentar aos procedimentos adotados em caso de falecimento, uma vez que a partilha do bem situado no exterior pode não ser tão simples como se espera.
*Elisa Junqueira Figueiredo é sócia fundadora do Fernandes, Figueiredo, Françoso e Petros Advogados, responsável pelas áreas de Direito privado com foco em contratos, contencioso cível, arbitragem, imobiliário, família e sucessões.
*Marjorie Braga Helvadjian é advogada do Fernandes, Figueiredo, Françoso e Petros Advogados, atua nas áreas de contencioso cível e imobiliário.
Fonte: Migalhas