O Senado aprovou na sexta-feira um projeto de lei que pode ajudar inquilinos com problemas financeiros gerados pelo coronavírus. Pelo texto, a Justiça não pode conceder nenhuma liminar autorizando o despejo entre os dias 20 de março e 30 de outubro. A medida ainda precisa passar pela Câmara antes de ser sancionada pelo presidente para começar a valer. A medida tem como objetivo proteger aquela pessoa que pode ter sido demitida, ter tido o salário reduzido ou ainda os profissionais liberais impedidos de trabalhar por causa da quarentena. Todas estas situações podem acarretar na diminuição dos ingressos, e consequentemente nos pagamentos de dívidas e compromissos.
Ela poderá dar segurança ao inquilino porque a lei se aplica aos contratos residenciais, conforme explica o vice-presidente de Gestão Patrimonial e Locação do Secovi-SP (Sindicato da Habitação), Adriano Sartori. Contudo, para Sartori, a primeira recomendação é o diálogo entre proprietário e locatário. “Estamos recomendando que as duas partes negociem, não adianta o proprietário dizer que não quer ouvir o locatário, ainda mais se ele sempre foi um bom pagador, porque o aluguel é uma renda de longo prazo”, analisa.
Para Sartori, dependendo da situação, romper um contrato pode até acarretar em maiores prejuízos porque o caso pode ir parar na Justiça, não se sabe quanto tempo o imóvel pode demorar para ser alugado novamente, além de comissões para imobiliárias e outros gastos. “Se este locatário sempre cumpriu com o aluguel e mostra que ele teve sua renda afetada, de forma comprovada, é necessário usar o bom senso. Por exemplo, se ele é um agente de viagens, é obvio que ele está sendo afetado”, exemplifica .
Outros exemplos de pessoas que poderão ter a renda afetada, são os pequenos comerciantes, porque estes foram os primeiros a fecharem suas portas. “Neste caso, nossa primeira recomendação, utilizando o bom senso, é aplicar um desconto na locação”, pondera.
Sucesso no diálogo
De acordo com o vice-presidente de Gestão Patrimonial e Locação do Secovi-SP, nos casos em que foi necessário fazer um acordo, ele foi exitoso. Por enquanto, a maioria de negociações envolvem locações comercias, cerca de 70%. Já os pedidos de acordo residenciais representam 30%. Sartori afirma que estes dados devem se inverter ao longo do tempo, e os acordos residenciais superarem os comerciais. “É natural que os primeiros acordos envolvam contratos comerciais porque eles foram os primeiros a fechar as portas”, destaca.
Sobre os tipos de acordos que vem sendo feitos, Sartori afirma que existem inúmeras possibilidades como desconto durante os meses da quarentena, colocar os valores para o final do contrato, mas corrigido, e ainda o parcelamento dos aluguéis. “O acordo deve ser razoável para as duas partes”, reforça. Sartori recomenda também que as pessoas não sejam oportunistas porque em muitos casos, o aluguel é renda e até mesmo a aposentadoria dos proprietários. “No setor residencial, em um levantamento junto as imobiliárias, entre cerca de 100 mil proprietários, 80% possui apenas um imóvel alugado”, indica.
De olho na lei
O advogado Luís Augusto Egydio Canedo explica que apesar de uma nova legislação estar sendo discutida no Congresso, a lei vigente já prevê situações como a da quarentena, chamada de “motivo de força maior”. Segundo advogado, ele pode ser utilizado por qualquer uma das partes que esteja “apertada” por este momento.
Canedo afirma que o recurso pode ser usado por inquilinos para ganhar tempo no pagamento ou para negociar um desconto. “O impacto deve ser dividido entre as partes e ser discutido mais pra frente, para decidirem se fica com o desconto permanente ou provisório”, pondera. Ele também defende que aquela pessoa que já está sofrendo a redução dos ingressos entre em contato com o proprietário para conversar e antecipar a negociação.
O advogado Rodrigo Ferrari Iaquinta destaca que um dos pontos positivos do projeto que está em discussão no Congresso são as novas funções do síndico. “Houve a ampliação poderes do síndico e a possibilidade de realização de assembleias condominiais por meios virtuais, algo que já vem sendo uma tendência na vida condominial, destaca.
Contudo o especialista critica o projeto por interferir em relações privadas. “O próprio ordenamento jurídico já possui institutos e elementos aplicáveis ao momento de crise que vivemos. Regulamentar demais pode criar travas às relações sociais e privadas”, pondera. “A locação sempre é um contrato bilateral e o interesse de ambas as partes deve ser ponderado, finaliza.
Locações comerciais
Já para as locações de pontos comerciais, o Sebrae recomenda “a renegociação extrajudicial destes contratos, pautada na boa fé e no bom senso das partes envolvidas”. Segundo a entidade, a Lei do Inquilinato afirma que qualquer uma das partes, de comum acordo, pode negociar um novo valor de aluguel.
Locador e locatário podem acordar, por exemplo, a concessão de desconto no valor do aluguel, por prazo determinado (exemplo: 3 meses a contar do início da pandemia), ajustando um valor que seja proporcional ao tempo de baixa de vendas sofrida pelo locatário.
Outra saída é ajustar um desconto por prazo determinado, com prorrogação do pagamento do valor para período posterior (exemplo: desconto de 50% do valor do aluguel por 3 meses, para pagamento do valor correspondente no ano seguinte).
O Sebrae lembra ainda que além da Lei do Inquilinato, também é válido utilizar o Código Civil, no qual a revisão ou o fim do contrato podem ocorrer “em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis”.
Fonte: Correio do Povo